CREA-PI e a APIEAS manifestam o posicionamento quanto ao Projeto de Lei n° 76/ 2023 que dispõe sobre a atualização Política Estadual de Meio Ambiente no território do Piauí
O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Piauí (CREA-PI) e a Associação Piauiense de Engenharia Ambiental e Sanitária (APIEAS), manifestam sua forte oposição ao Projeto de Lei nº 76 de 08 de novembro de 2023, que dispõe sobre a Política Estadual de Meio Ambiente.
O Estado do Piauí é abençoado com uma biodiversidade singular, representando uma extensa área de intercessão e transição ecológica que engloba uma rica variedade de biomas, ecossistemas e espécies com características únicas de adaptação. No entanto, a sociedade piauiense corre sério risco de presenciar um retrocesso alarmante na Legislação Ambiental Piauiense.
A proposta de atualização da Política Ambiental do Piauí possibilitará uma exploração desenfreada dos recursos ambientais que podem resultar na poluição e degradação dos ecossistemas e no comprometimento da capacidade de resiliência dos nossos ambientes naturais, agravando ainda mais os impactos negativos provenientes das mudanças climáticas.
O artigo 19 do referido projeto enfatiza que será dado prazo razoável para o processo de Licenciamento Ambiental, em detrimento apenas da boa-fé e dos princípios de liberdade econômica do empreendedor, quando que o Licenciamento Ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente que tem como natureza jurídica atuar como tutela preventiva do meio ambiente, prevenindo a ocorrência de impactos e danos ambientais negativos.
O Licenciamento Ambiental é conceituado juridicamente pela Lei Complementar n° 140 de 8 de dezembro de 2011, que estabelece a definição de que o Licenciamento Ambiental é o procedimento administrativo destinado a licenciar as atividades e empreendimentos efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental e é complementado pelo texto legal mencionado que esses estabelecimentos e atividades dependerão da apresentação do estudo prévio de impacto ambiental.
É lógica a compreensão de que os elementos cruciais que garantem a agilidade da análise técnica dos órgãos ambientais são: o quantitativo de corpo técnico suficiente para suportar as demandas internas de processos ambientais; e o atendimento completo das informações ambientais necessárias para a análise técnica, que deverão estar contidas nos estudos prévios de impacto ambiental e em outras documentações complementares que o empreendedor tem por obrigação fornecer, quando requisitadas pelo órgão ambiental, observando os termos de referência com os critérios cabíveis.
Contraditoriamente, o parágrafo 2º do artigo 19 atribui que a solução da morosidade do processo de licenciamento do órgão ambiental estadual, no caso da implicação em prejuízo ao empreendedor e ou ao Estado, autoriza expressamente a emissão de Licença Ambiental de natureza cautelar pelo Secretário de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí, autorizando o vigor do Licenciamento Ambiental Cautelar até a superação da morosidade interna do órgão ambiental estadual. Ao afirmar tal pressuposto, recai o entendimento de que a apreciação e a análise técnica obrigatória dos estudos prévios de impacto ambiental serão dispensadas para a emissão da Licença Ambiental, em caso de morosidade, afirmando ainda que este regramento terá eficácia jurídica do licenciamento para todos os fins de direito.
O parágrafo 5º do artigo 23 deflagra a nulidade do valor de multa administrativa decorrente da lavratura de Auto de Infração Ambiental, aplicados aos empreendimentos que forem configurados como causadores de danos ambientais, quando estes possuem pedidos de Licenciamento Ambiental em curso. Já o parágrafo 6º do mesmo artigo delibera sobre a aplicação de descontos em multas ambientais, através de termos de ajustamento de conduta, sobrepondo mais uma vez a boa-fé do empreendedor aos princípios básicos constituídos no Direito Ambiental Brasileiro, mesmo quando já estão configurados os danos ambientais provocados pelo empreendimento e/ou atividades econômicas.
Trazendo os princípios fundamentais à luz do Direito Ambiental, constituído à duras penas no Brasil, é incontestável o reconhecimento da supremacia do interesse público na proteção ambiental, uma vez que o artigo 225 da Constituição Federal atribui o direito de que toda a coletividade tem ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo, atribuindo assim à sociedade a titularidade do bem público ambiental. Dessa forma, os interesses privados de empreendimentos e atividades econômicas não podem sobrepujar o direito coletivo ambiental, não devendo à boa-fé e liberdade econômica exercer inversamente a supremacia ao interesse coletivo.
Um outro princípio fundamental, igualmente, importante é a prevenção, destacada pela Política Nacional do Meio Ambiente, Lei nº 6.938/1981, quando no ato da exigibilidade do estudo prévio de impacto ambiental para a concessão do procedimento de Licenciamento Ambiental. O órgão ambiental estadual, executor das atividades administrativas ambientais no Piauí, tem por obrigação legal fazer cumprir as matrizes federais dos regramentos legais ambientais.
Paralelamente, o princípio da precaução, trazido a exemplo pela Lei de Crimes Ambientais, Lei nº 9.605/1998, incorre às penas previstas em seu Artigo 54, quando não forem executadas as medidas de precaução necessárias para serem combatidos os riscos de danos ambientais irreversíveis. Aqui fica declarada a responsabilidade administrativa, civil e criminal do infrator que, ao se enquadrar no crime ambiental especificado, está sujeito às punições previstas em lei que não se confundem com a reparação do dano ambiental causado, que é um outro aspecto exclusivo de responsabilidade de reparação pelo infrator.
A possível lentidão de um processo de Licenciamento Ambiental não pode ser resolvida com a flexibilidade e afrouxamento do Licenciamento Ambiental. O Estado tem o dever de munir o órgão ambiental com o corpo técnico suficiente para suportar o fluxo de processos ambientais e distribuir unidades de gerência que absorvam a gestão ambiental regionalizada. O Estado também tem o dever de aperfeiçoar as diretrizes técnicas dos estudos ambientais a fim de reduzir o retrabalho de análises técnicas decorrido de pendências por falta de informações completas nos termos de referência, além de ser seu dever a fiscalização ambiental restritiva, de modo a coibir a reincidência dos crimes e danos ambientais cometidos por seus infratores.
É indiscutível necessidade de revisão desse projeto de lei, ao passo que não se pode confundir os instrumentos de Licenciamento e Fiscalização Ambiental como procedimentos meramente burocráticos, quando ambos na verdade possuem extrema relevância na defesa do direito coletivo ambiental.
Exigimos que seja feita uma revisão cuidadosa e participativa que garanta o futuro do Desenvolvimento Sustentável do nosso Estado, preservando a sadia qualidade de vida da presente e futuras gerações e o meio ambiente ecologicamente equilibrado.